quinta-feira, 26 de julho de 2012

Para ler o texto abaixo, ouça essas músicas, ou ouça enquanto lê...


COMO EU QUERIA QUE TUDO FOSSE PRA SEMPRE


                Sabe aquele dia que você acorda com uma música na cabeça? Pensei em coloca-la no MP3, para ouvi-la, mas como estava atrasado para o trabalho, saí apenas cantando. Resolvi ouvir rádio, a música era antiga, quais as chances de que ela estivesse lá, esperando por mim? E por mais incrível ou divino que fosse lá estava ela. Meus olhos se encheram de lágrimas com esse pequeno ato de carinho que muitos chamariam de coincidência. Não poderia deixar de escrever sobre o porquê de querer tanto ouvi-la, do quanto ela me fazia pensar. A música era “Por Enquanto”, de Renato Russo, mas gosto da versão de Cássia Eller, que fui contemplado pela rádio. De brinde ganhei uma chamada “Sensações” de Paula Fernandes.
                De tempos em tempos sou atacado pela angústia do eterno. Existem certos momentos da vida em que tudo parece tão perfeito, em harmonia e todos estão felizes, as coisas funcionam, a vida é maravilhosamente admirável. Tão perfeito que dá vontade guardar tudo numa sala e viver aquilo eternamente. Nos apegamos aos momentos de felicidade e queremos guarda-los, tentando nos iludir de que aquele momento é eterno.
                Saudade. Maldita palavra que não tem tradução. Quantas vezes me pego lembrando do meu passado e dizendo: Como aquilo era bom. Talvez seja apenas eu, mas muitas vezes parece que momentos passados são sempre melhores do que os que vivo agora. E sei que daqui um tempo lembrarei do agora e parecerá melhor. E assim será durante todos os dias da minha vida. Isso é a nostalgia. Isso é divino.
                Fico pensando em quando quero guardar os bons momentos, desejando que eles sejam eternos. Não haveria saudade, seria felicidade para todo o sempre. Viver os melhores momentos, com os melhores amigos, com as pessoas amadas, todos os dias, sempre e sempre. Será? Por que tudo tem que passar?
                Acho que o maior sofrimento de nossa vida é aceitar o tempo que passa. Aceitar que até as alegrias que estamos tendo passarão. Esse buraco do eterno tem sempre que estar livre, por isso tudo se acaba e cabe a nós decidir com o que iremos nos preencher. As alegrias passam não para nos deixar tristes, mas para abrir caminho para novas. A vida é sucessão de oportunidades para ser feliz ou infeliz, nós devemos decidir.
                Viver as alegrias do passado como nostalgia, com saudade, é uma graça divina. Como é bom sentar numa roda de amigos ou familiares e lembrar daqueles bons momentos que vivemos juntos. Muitas vezes lágrimas vem nos olhos de lembrar do romance que terminou, daquela tarde com os amigos, daquele momento em que você se sentiu realmente vivo. Mas passou. Tudo isso tem seu espaço no passado, na memória. O que somos tentados é deixar esses momentos tomarem lugar de outros que devemos no presente. Viver acreditando que nada pode ser melhor que a saudade. Nos perdemos em lembranças e nos tornamos uma peça de museu sem vida, que se apegou a um ideal de que a vida nunca pode ser melhor do que já foi.
                Me pergunto porquê Deus nos permite tamanha angústia. Quantas vezes parece que quando um grande momento de alegria acaba, junto se esvai a vida. Um vazio tão grande nos preenche a alma e a vontade de viver passa. Logo enxergo que precisamos disso. Se encontrássemos a felicidade plena por aqui nunca iriamos buscar Alguém maior. Nunca teríamos tido consciência de que existe um Deus. Num mundo onde toda a felicidade é passageira temos noção de que assim também é a vida e que se não somos plenos aqui, devemos encontrar essa plenitude em algum lugar. Aí que vem o Céu. O lugar onde as felicidades que eu sempre quis trancar numa sala pra vivê-las pra sempre existe.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

SER CRENTE SEM SER CHATO


          Lembro-me da minha infância no interior, dos domingos de manhã e uma situação de suspense interessante: A família tomando café, de repente, ouvia-se o som da campainha. Todos ficavam em silêncio, alguém ia até a janela e espiava silenciosamente: - Vieram falar de Deus. Toda a família já conhecia a ordem; ficar em silêncio até eles irem embora.

         Minha família sempre foi católica e aprendemos a amar e respeitar a Deus, mas aquelas pessoas vinham falar de um Deus chato demais pra se ouvir num domingo de manhã. Eu ficava imaginando quem eram aqueles seres estranhos, em que os homens usavam terno e gravata e as mulheres grandes saias e cabelos presos, que tinham panfletos horríveis (com animais e pessoas convivendo num jardim) e falavam sobre conversão e Deus. Certa vez, fui pego desprevenido e acabei atendendo a porta, foram longos minutos ouvindo sobre o fim dos tempos que estava próximo e a necessidade de deixar a Igreja que eu frequentava e encontrar o verdadeiro Senhor Jeová na igreja deles, claro que sendo um Deus muito formal, eu deveria estar de terno e gravata para esse encontro.

          Era um Deus chato, um Deus que eu nem queria ouvir falar, que eu tinha que fingir não estar em casa: “Eis que estou a porta e bato...”, bate e é insistente, usa terno e gravata e tem panfletos horríveis. Desculpe Senhor, se é assim, não vou te atender.

          Como disse, cresci em cidade pequena, interior de Minas, onde a missa aos domingos tocava sempre a mesma música, com as mesmas pessoas velhas e as crianças que eram levadas pelos pais, mas ficavam do lado de fora da Igreja, brincando (até a primeira comunhão, depois éramos obrigados a participar da celebração). Crismávamos sob pressão e saímos de lá conhecendo muito pouco sobre Deus. A maioria só voltaria a Igreja depois de mais velhos, quando a vida agitada da juventude acabasse. Eu não abria a porta para aqueles que queriam falar de Deus pra mim, mas era obrigado a ir até Deus na Igreja, que para mim, era até pior. Crente tinha virado sinônimo de chato.

          Demorei anos para descobrir Deus em minha vida e logo que isso aconteceu, imaginei quem era aquele que estavam pregando na minha infância. Conheci um Deus de Amor, cheio de contrastes: alegre, animado, silencioso, interessante e acima de tudo, vivo, diferente daquele que eu precisava me esconder nos domingos de manhã (também já fingi estar dormindo para não ir à missa, esperava minha mãe sair e depois levantava da cama). Descobri que Deus não é chato, nós é quem somos quando falamos Dele.

        Certa vez ouvi uma frase muito marcante para minha caminhada de fé: Deus não está interessado Nele mesmo, Ele está interessado nos homens. Deus não precisa Se defender, Ele está mais interessado em ajudar os homens. Essa frase me ajudou a entender o que acontece com as religiões, que muitas vezes se tornam chatas e entediantes. Os homens querem sempre “defender” Deus e acabam se perdendo em discursos intermináveis e panfletos horríveis (os panfletos são muito feios).

          A Igreja tenta sempre acompanhar a evolução da forma do discurso humano, adaptando a sua forma de evangelizar ao mundo atual. Lembrando que não é o conteúdo do discurso que deve mudar, mas sim a forma como é dito. A sociedade evoluiu e os meios de se comunicar também (inclusive a arte dos panfletos, #ficaadica). Deus é o mesmo, mas a forma que falamos sobre Ele tem que mudar, se nosso discurso é chato, as pessoas irão conhecer ao Senhor como alguém chato.

          Palavras são sempre uma ótima forma de evangelização, a Bíblia em si é a Palavra de Deus. Porém nossos discursos estão se perdendo em palavras demais. O que mais me incomodava sobre a evangelização na minha infância era que ouvia coisas incríveis e muito bonitas sobre Deus, mas não via nenhuma ação naquelas palavras. Deus é amor, mas as pessoas não amavam. Deus é paz, mas as pessoas não eram desesperadas. Deus é felicidade e todos estavam tristes. Deus é liberdade e eles usam roupas apertadas e se trancam do mundo.

          O crente é chato porque fala demais e não faz. O crente diz pra ser feliz, mas é mal-humorado. Diz pra ser gentil, mas é mal-educado. Diz para ser humilde, mas é o dono da verdade e o escolhido do Deus de gravata. Diz para amar, mas faz fofoca, discrimina, odeia, é indiferente. O crente é muito chato.

        A Palavra de Deus só converte porque é acompanhada de Amor, de obras, de ações maravilhosas que Ele realizou por nós. Ela é viva porque é verdadeira. A palavra do crente é cheia de “crentices”, de falsas verdades, de orgulho e da defesa de um Deus que não precisa dela. Deus não está interessado Nele mesmo.

          A conversão é uma atitude de vida, uma mudança do nosso coração para com os outros. Sim, com os outros. Se eu tenho Deus na minha vida, eu tenho que ser uma pessoa diferente com os outros, com uma atitude de Amor com o irmão. São João em suas cartas já dizia isso muito bem: Quem diz que ama a Deus e odeia o seu irmão é um mentiroso.

          Na internet é possível ver essa onda terrível de crentices e ódio por parte de nós cristãos. Experimente algum dia ler uma notícia polêmica em sites grandes e logo depois leia os comentários. Queimar eternamente no fogo do inferno é o “carinho” mais comum por parte dos crentes. Converta-se ou morra. Os crentes perderam a humildade e se consideram uma raça superior, que tem que converter os outros não por Amor, mas por medo de Deus. O pensamento se tornou: Se você quiser se converter, te receberei junto aos melhores escolhidos por Deus, caso contrário, queime no inferno filho de satã. Será que estamos lendo a Bíblia, mas esquecendo de vivê-la?

          Os ateus tem ganhado mais força graças a essa intolerância por parte dos crentes, pois eles têm todo o material necessário para nos acusar. Um crente chato é o modelo ideal para um ateu falar sobre a inexistência de Deus, afinal, se essa pessoa amargurada e repleta de ódio é um religioso, imagine como é esse Deus que ela acredita. Porém, diante de uma alma caridosa, amável e repleta verdadeiramente da graça divina, não existe argumento que possa atingi-la. O verdadeiro crente não precisa de crentices para mostrar Deus, pois Deus já se mostra pelas atitudes de Amor, através dela. O que dizer, por exemplo, de uma Madre Teresa de Calcutá? Ela amou, contra isso, não existem argumentos. 
 
          Enfim, o verdadeiro crente não precisa bater de porta em porta, nem defender Deus diante do mundo, sequer fazer panfletos horríveis para tentar converter alguém. O verdadeiro crente converte porque tem Deus em sua face, em suas obras e em sua forma de viver. Se quiser ser chato, tudo bem, mas não use Deus como justificativa para sua falta de Amor.