Se existe uma coisa interessante em
nós humanos é a nossa necessidade de relacionamentos. Desde que nascemos já
buscamos o colo de mãe ou de pai, aquele aconchego, aquela segurança de confiar
plenamente no próximo. Crescemos, ganhamos peso e nossos familiares já não são
capazes de nos carregar, mas a necessidade do carinho permanece: Quem nunca
fingiu estar dormindo no sofá só pra ser carregado para a cama? Passamos então
a buscar esse toque nos amigos, nas pessoas próximas, passamos a conhecer
nossos corpos, entramos na adolescência e essa necessidade de se relacionar
ganha novas formas, novos carinhos e novos olhares, se tornando madura na vida
adulta, ou ao menos assim deveria acontecer. Vamos crescendo e essa necessidade
“básica” permanece, procurando alguém que a preencha completamente.
O problema é que muitas vezes, esse
alguém demora demais pra chegar. Com isso, a necessidade de relacionar-se
começa a se transformar em carência. É fato que todos somos, alguns mais,
outros menos, carentes. Esse sentimento é natural, somos seres que prezam pela
vida social e pelos relacionamentos interpessoais, somos comunidade. Porém a
carência pode se tornar um sentimento opressivo e destruidor em nossa
personalidade, esmagando aquilo que Deus planejou inicialmente para nós, nos
transformando em prisioneiros de nossa personalidade ou ainda pior, dos outros.
Na infância, somos dependentes de
nossos familiares, sejam pais, avós ou aqueles que se tornaram responsáveis por
nosso crescimento. Nessa fase da vida, ser dependente é natural, é muito mais
do que uma opção, é uma necessidade. Com o passar do tempo, os pais começam a
nos “libertar” de seus cuidados: o colo passa a ser menos frequente. O correto
é que nos acostumemos com essa situação, mesmo que esse momento de “abandono”
familiar seja difícil. Começamos a nos moldar nas regras de convivência da
sociedade.
O problema é que as regras tem
mudado após a geração televisão. O convívio social diminuiu graças a falsa
ideia de interação dada pelos meios de comunicação. Cito como exemplo a missa,
que antes, era um grande local de encontro da comunidade, todos iam conversar,
“atualizar” seus perfis sociais, hoje a interação física deu lugar a chats na
internet, até a missa muitos assistem pela TV. Isso tem feito as pessoas
crescerem cada dia mais carentes de convívio e relacionamento e isso se reflete
fortemente na vida adulta.
Na adolescência a carência se
transforma em desejo. Necessitamos do toque, do beijo, de sentir outras pessoas.
A nossa necessidade de carinho é direcionada para os outros e queremos
experimentar todas as pessoas. Quanto mais, melhor. Mas ter todos pode ser
sinônimo de não ter ninguém.
O adolescente leva os
relacionamentos de maneira tão extrema que aquilo passa a ser a necessidade
básica dele. Sair, festas, baladas, tudo é uma simples desculpa para estar com
outras pessoas. Se o jovem está mal na escola, está tendo problemas nos
relacionamentos, sejam familiares ou sejam amorosos. Muitos entram em depressão
por não conseguirem encontrar alguém que preencha essa necessidade tão grande
de carinho.
Com a idade adulta, finalmente atingimos
o equilíbrio emocional. Não. Dificilmente se vê um adulto que consegue lidar
bem com a carência e seus relacionamentos. Os diversos problemas no
amadurecimento pessoal nos fazem crescer vazios, incompletos. Passamos então a
buscar essa pessoa que nos fará felizes e completos. E assim surge o grande mal
do século: o homem objeto.
Como relacionar-se é uma necessidade
básica nossa, precisamos inevitavelmente do outro. Ninguém pode viver
completamente sozinho. Quando a carência se torna grande demais, começamos a
ferir nossa personalidade pelo social ou simplesmente pela atenção. Esse ataque
pode ter dois âmbitos: ferindo a nós mesmos e ferindo os outros.
Começando pelo segundo, nós
acreditamos que somos melhores que os outros e os outros são obrigados a se
adaptar a nossa personalidade e nosso modo de realizar as coisas. Isso se
reflete especialmente no trabalho: sufocamos o trabalho dos outros e a forma
como ele a realiza. Se estamos habituados a realizar de uma forma, alguém que o
faça diferente passa a ser um inimigo em potencial. Algumas vezes sequer
sabemos realizar o trabalho do outro, mas insistimos que ele realize como
acreditamos ser correta. Para nós. Isso nos transforma em pessoas arrogantes e
dominadoras. O problema é que quem mais sai ferido somos nós mesmos, que
acabamos com nossos relacionamentos o tempo todo.
Essa forma de ataque ao outro ainda
se reflete em relacionamentos amorosos: Não aceitamos os gostos e desejos da
pessoa que estamos juntos. Forçamos que a personalidade dela se adapte ao nosso
modo de viver e de ser. Ela tem que gostar da nossa comida, das mesmas cores,
dos mesmos filmes. Matamos a personalidade do outro por nossa arrogância de
acreditar que nosso modo de ver a vida é o melhor. Por fim, acabamos isolados e
sozinhos.
Do outro lado da história vem aquele
que mais sofre, aquele que fere a si mesmo, que abre mão completamente de si
para o outro. Esse tipo de pessoa, em relacionamentos amorosos, se torna objeto
na mão da pessoa que “ama” (em aspas porque isso é uma falsa visão de amar) e
no trabalho, se torna um empregado descartável, que só se mantém por ser o
tapete onde os outros podem limpar seus pés.
Nos relacionamentos amorosos o casal
tem que ceder em ambos os lados. Não é justo e muito menos correto, que apenas
um abra mão de si. O problema é que a carência muitas vezes é tão grande, que a
pessoa, por medo de não encontrar outro alguém em sua vida, abre mão de tudo. É
a total desvalorização do ser humano, uma afronta ao Amor de Deus por cada um.
Buscamos
relacionamentos porque, como dizia Sto Agostinho: Existe em nós um vazio do
tamanho de Deus. Os outros são uma pequena imagem de Deus para nós, assim,
queremos nos preencher apenas no outro e esquecemos que Deus pode nos preencher
completamente. Temos que ser para o outro o mesmo que queremos que ele seja
para nós, temos que ter o Amor perfeito, de Deus, para ser Amor para o outro.
Se encontramos a fonte inesgotável do Amor, que está em Jesus, podemos nos doar
para o outro sem nunca nos esvaziarmos e sermos, no outro, completos. Sem o
Amor de Deus, somos incompletos e dois seres vazios, não podem se completar. O
relacionamento verdadeiro é sim, a três: o homem, a mulher e Deus.
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